terça-feira, 7 de abril de 2009

I

Aguardo, na planície.
Sinto o chão nos meus pés.
Respiro a brisa que passa por mim.
Conheço-lhe o cheiro, é meu,
Como toda a natureza é minha
E eu sou dela.

Baixo o olhar.
Ali está.
Ali está o exército que vou enfrentar.
A adrenalina inebria-me,
Os sentidos preenchem-me
E bloqueiam a razão.
Preparo-me, anseio,
Espero, quase desespero.

Quero. Quero terminar isto
Quero romper, quero chacinar...
Quero... Não.
Não quero.

Volto a olhar para a infinidade
De céu acima de mim.
Respiro.
Regresso a mim.
Porque não vivo e não mato?,
Porque não sangro e não morro?,
Pela fantasia que há em mim.
Porque vivo sem vivê-la.
Porque sou eu por ser eu.
Porque perdido no meu caminho
Encontrei-me a mim mesmo.

Não quero morte. Não quero os despojos.
Eles não valem o sangue.
Não quero sangue !
Não quero mortes...

Entrei em brigas, em batalhas, em guerras !
Lutei e, sem saber lutar, ganhei.
Sabia com o que contar,
Sabia o que esperar.
Não estava perdido, não estava sozinho.
Mas, nesta guerra, estou sozinho,
Estava sozinho.
Andei à deriva
Sem saber o norte,
Sem saber para onde lutar.
Aprendi a fazê-lo.
Aprendi a avançar, aprendi a recuar.
Aprendi a rechaçar até o ar.
Aprendi a quase provocar a debanda.
Não aprendi a derrota.
Não me culpo.
Podia ter feito mais,
Podia ter lutado mais,
Mas não, não vou lutar esta guerra.
Fiz o que fiz, porque sim.
É uma resposta tão boa
Como outra qualquer.

Não vou lutar.
Dói. Mais do que lutar, dói não lutar.
Mais do que nos deixarmos ir, dói não deixar.
Não quero. Que glória obteria
Com tal vitória ?
Somar-se-me-iam mortes, apenas.
Espero, descanso,
Esqueço onde estou, esqueço a arte.
Mais tarde, talvez. Mais tarde

Volto a descer o meu olhar.
Vejo o que tenho à frente.
Sinto a brisa, de novo, a passar.
O Sol está-se a pôr.
Aprendi a respeitar a guerra.
Respeito-a, amo-a, talvez demais.
Talvez.
Viro costas,
Porque o Homem é Deus
Quando tem a vontade.

Só espero que não me ataquem agora.
Prefiro morrer em glória
Que de costas para a batalha.
Até pareceria que fugi.
Não vou lutar. Vou-me embora.
O vento passou. O sol pôs-se.


Ricardo Pereira

5 comentários:

  1. Cheira-me ao heterónimo Alberto Caeiro, literalmente.

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  2. eish! Tem influencias de Pessoa, mas de todos os heterónimos, Alberto Caeiro era o tiro mais ao lado que podias dar x]

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  3. alguém não esteve atento nas aulas de português...

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  4. e refiro-me a esse Anónimo que ousou roubar-me o anonimato.tanto atrevimento.

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  5. Logo na primeira estrofe está uma gralha. Cheiro e não cheio. Só te faço a correcção porque seria uma pena uma coisa tão bem feita ter uma gralha. Não estás no curso errado? Grande, grande grande post! Parabéns, Magnífico;)

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